17/09/2024 às 18h08min - Atualizada em 18/09/2024 às 00h01min

Impactos, desafios e avanços nos quatro anos da LGPD: A Proteção de Dados no Brasil

KAMILA GARCIA
Davi Raiol

Por Amanda Ramalho, especialista em Direito Empresarial e Compliance. Com mestrado em Direito pela Universidade da Amazônia (UNAMA), Doutoranda em Direito Comercial pela PUC/SP

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) completa quatro anos de vigência no próximo dia em 18. Ela trouxe um novo momento em termos de responsabilidade, segurança e transparência nas relações entre empresas e indivíduos, tendo como algo curioso a adesão das pessoas físicas, em especial no que diz ao aumento do questionamento acerca do fornecimento de seus dados em diversos contextos.

Ao longo desse período, a aplicação da LGPD vem se consolidando, destacando avanços, desafios contínuos e uma crescente jurisprudência, em especial nos entendimentos administrativos da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). 

A LGPD visa proteger os direitos fundamentais de privacidade e liberdade dos cidadãos em relação ao tratamento de seus dados pessoais, ou seja, empoderar o indivíduo no fornecimento ou não de suas informações a terceiros, comumente empresas. 

Uma característica peculiar dela, é o fato de sua aplicação se estender tanto para empresas brasileiras quanto estrangeiras que operam no Brasil ou oferecem serviços aos consumidores do país. No mesmo sentido que o regulamento europeu (GDPR - General Data Protection Regulation) estendeu sua aplicação para além de seu território físico.

Para além da possibilidade do questionamento judicial do mau uso dos dados pessoais e dados sensíveis, há a preocupação com a responsabilidade administrativa, que fica ao cargo da ANPD, que, para além de normativos, tem o papel de intensificar o processo de conscientização das empresas sobre a importância da conformidade com a legislação, além de regular e fiscalizar a aplicação da LGPD.

Em termos de adequação, pesquisas recentes mostram que aproximadamente 70% das grandes empresas no Brasil já adotaram medidas formais de conformidade com a LGPD, incluindo políticas de privacidade, nomeação de encarregados de dados (DPO) e treinamentos de equipe. Ainda assim, na prática, ainda se percebe muita insegurança das pessoas na devida cautela no manejo de seus dados, tanto pelas empresas, quanto pelos próprios órgãos e entidades da administração pública; da mesma forma, ainda se nota pouca mudança no que diz respeito a captação desses dados em estabelecimentos como hospitais, laboratórios e até mesmo de natureza comercial.

Com a vigência da LGPD, o Poder Judiciário brasileiro começou a ser demandado em uma série de casos envolvendo a proteção de dados, muito especial em relações de consumo e o vazamento de dados. Esses casos ajudaram a moldar, de certa forma, a interpretação da lei e estabelecer alguns precedentes para situações futuras.

Em 2022, quando o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) proferiu decisão contra uma operadora de saúde que compartilhou dados de seus pacientes com terceiros sem o consentimento expresso. A operadora foi condenada a pagar uma indenização de R$ 50 mil a um dos reclamantes, sendo uma das primeiras condenações relevantes com base na LGPD. Essa decisão destacou a necessidade de transparência e a importância do consentimento explícito no tratamento de dados sensíveis.

Outro caso importante envolveu o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que determinou, em 2023, que empresas não podem coletar dados pessoais para fins de marketing sem autorização clara e expressa do titular. A decisão baseou-se no princípio da finalidade e na limitação da coleta de dados, estabelecendo um importante precedente na jurisprudência nacional.

Apesar dos avanços significativos, a adequação plena à LGPD ainda representa um desafio para muitas empresas, principalmente as pequenas e médias. Destacando-se aqui a falta de recursos financeiros e humanos dedicados ao cumprimento da legislação como um dos principais obstáculos, especialmente considerando a necessidade de investimento em tecnologia e capacitação.

Ainda que se tenha tido um tempo para adequação, o valor agregado de tecnologia e de seus profissionais, não era um investimento comumente feito por empresas de menor complexidade operacional, o que causou, de certa forma, uma necessidade de repensar a forma de gerir seus recursos e de assumir riscos frente à possibilidade de autuação administrativa e indenizações de ordem judicial.

Outro ponto de desafio tem sido o tratamento de dados em setores que lidam com grandes volumes de informações sensíveis, como o setor da saúde e o setor financeiro. Ainda que haja um panorama diferente no acesso aos recursos financeiros, profissionais e tecnológicos, não significa que estabelecer os processos humanos seja 'mais fácil', pelo contrário, mudar práticas culturalmente perpetuadas também é um grande desafio.

O futuro da LGPD aponta para um caminho de maior conscientização e penalização para as empresas que não estiverem em conformidade, por isso, não se cabe pensar nos negócios sem levar em consideração a perspectiva de conformidade. 

O rigor na fiscalização tende a aumentar, especialmente com a ANPD estruturando melhor seus mecanismos de controle. Além disso, espera-se um avanço na jurisprudência, com novos casos sendo julgados e novas interpretações da lei sendo consolidadas. Espera-se, ainda, que o judiciário ganhe ainda mais perspectivas para analisar os casos concretos nos termos da legislação.

É evidente que a evolução tecnológica também trará novos desafios à aplicação da LGPD, da mesma forma que colocará ao mercado a necessidade de se reinventar em diversos aspectos. Com o crescimento da inteligência artificial e da internet das coisas (IoT), o volume de dados gerados e compartilhados continuará a aumentar exponencialmente, exigindo que a legislação acompanhe as inovações tecnológicas.

Por fim, os quatro anos de vigência da LGPD já trouxeram mudanças visíveis para o cenário empresarial e jurídico no Brasil, ainda que não se possa dizer que já vivemos em um ambiente realmente seguro. No entanto, a adequação plena à lei ainda exige esforços contínuos, principalmente em termos de cultura organizacional, investimentos em tecnologia e, acima de tudo, conscientização sobre a importância da privacidade e proteção de dados para todos os setores da economia.


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KAMILA BATISTA GARCIA
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